Agenda Paroquial:

quarta-feira, 30 de maio de 2012

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Açores precisam de um Sínodo

D. António de Sousa Braga tem 71 anos e é bispo de Angra há dezasseis. Em entrevista à Agência ECCLESIA diz que gostaria de ter realizado na diocese um sínodo que dinamizasse as lideranças em cada “Unidade Pastoral Ilha”.

MC/Agencia Ecclesia
Agência Ecclesia - Após dezasseis anos como bispo residencial, é possível coordenar com mais segurança o trabalho de uma diocese dispersa?
D. António de Sousa Braga - Estou há dezasseis anos como bispo residencial dos Açores e conheço bastante a sua realidade, que ignorava por ter feito a minha vida religiosa e sacerdotal fora do arquipélago. Fui educado na religiosidade, na cultura açoriana e na “açoraneidade”. Isso dá-me a possibilidade de compreender melhor o nosso povo e de procurar caminhos de respostas às expressões da vida religiosa.

AE - Que balanço faz?
ASB - Depois destes anos, quando praticamente já estou no final do meu serviço episcopal – daqui a quatro ou cinco anos espero que haja um bispo novo – o balanço que posso fazer é de que não conseguimos neste arco de tempo dar as respostas que consideramos necessárias para os tempos que correm.
Vivemos numa mudança de época, num período de transição: saímos de um esquema muito bem estabelecido e ainda não sabemos como será, não temos receitas!

AE - O que é que gostava de ter feito?
ASB - Gostava que tivéssemos conseguido realizar um sínodo.
A diocese existe desde 1534 e ao longo da sua história só realizou um. Os desafios pastorais são tão grandes que acho que é necessário prever a realização de um sínodo para tomarmos consciência da realidade no mundo de hoje: as ilhas já não estão isoladas e vivemos num território geográfico descontínuo, não podendo por isso seguir esquemas de outras dioceses do continente.
Eu teria desejado que nós chegássemos a realizar um sínodo mas não foi possível. O que até não será negativo porque decorre na Igreja universal, e em Portugal, um caminho de renovação, nomeadamente com o Sínodo dos Bispos para a Nova Evangelização [de 7 a 28 de outubro de 2012, no Vaticano], de onde sairão orientações que ajudarão as Igrejas particulares a encontrar o seu caminho.

AE – A realização de um sínodo será a melhor metodologia para dar unidade à coordenação pastoral num território que é uma diocese, mas com nove ilhas?
ASB – Pela minha experiência nestes dezasseis anos temos de fazer uma grande aposta na Unidade Pastoral Ilha. Cada Ilha tem de ter uma coordenação e orientação pastoral. Claro que tem de haver linhas gerais, mas a serem concretizadas em cada uma.
Nós formamos uma unidade, tendo a diocese contribuído para essa ideia de unidade dos Açores; mas cada Ilha, mesmo do ponto de vista religioso, tem tradições próprias e é diferente. Tem, por isso, de formar uma unidade pastoral.
O grande problema é encontrar, em cada ilha, líderes que sejam capazes de orientar e aplicar à própria realidade as orientações da diocese.

AE – Seria preciso um bispo para cada ilha?
ASB – Não... Nós já temos em cada ilha a Ouvidoria, correspondente ao arciprestado. Em São Miguel, por exemplo, há oito.
O Ouvidor é uma figura que, em comunhão com o bispo, orienta a pastoral, porque esta joga-se na Unidade Pastoral Ilha.

AE – Brevemente vai ordenar seis sacerdotes diocesanos e um franciscano…
ASB – Nestes dezasseis anos já ordenei cerca de 40 sacerdotes (não é mérito meu, pois colho o que outros semearam). Ordenei uma média de três por ano.
É um grupo significativo, que corresponde às necessidades da Igreja. E eu procuro fazer ver à diocese que temos de estar abertos às necessidades da Igreja universal.

AE – A diocese poderia enviar sacerdotes em missão, por exemplo para o continente?
ASB – Sim, mas depois de reorganizar a pastoral. Nós ainda estamos muito ligados à pastoral paroquial, onde as pessoas estão habituadas a ter o seu pároco. Em proporção populacional temos bastantes padres. Por isso temos obrigação de ajudar a Igreja universal.

AE – De que forma prepara as lideranças de que sente falta?
ASB – Sensibilizamos e motivamos os padres em cada Ouvidoria. Mas é muito difícil a um sacerdote ser o líder e orientador dos colegas. E creio que é necessário procurar novas gerações, no Seminário, para uma maior liderança.

AE – Com tempos de formação no exterior também?
ASB – Como temos o Seminário com aulas internas e um quadro de professores próprio, temos por tradição mandar formar vários padres nas universidades romanas, depois de alguns anos de experiência pastoral.
Neste momento temos de resolver o problema da filiação do Seminário à Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, para garantir o título académico aos alunos que frequentam o curso no Seminário, o que ainda não temos.

AE – Quer isso dizer que o curso não é reconhecido academicamente?
ASB – Não. Até há uns anos o curso era equiparado a bacharelato mas agora esse título não existe. Estamos em conversações com a Faculdade de Teologia para assegurar uma ligação que garanta aos sacerdotes que, quando terminam o seu curso, tenham o título académico.
Espero ter esta questão resolvida antes de sair da diocese.

Ilhas cada vez mais pequenas
AE – Em tempos de crise, a pobreza e o desemprego estão a afetar particularmente a diocese?
ASB – Nalgumas Ilhas sim, nomeadamente em São Miguel, onde a construção parou.
Penso que há situações novas: a pobreza envergonhada, gente que estava mais ou menos bem e agora está no desemprego.
Os Açores são uma região pobre e muito dependente do exterior. Se faltar o apoio do exterior os Açores vão encontrar algumas dificuldades.

AE – A emigração está a aumentar?
ASB - Não tenho estatísticas. Fala-se, nalgumas Ilhas, que os jovens não estão a voltar. O que já acontecia: jovens que acabam os cursos e não regressam para as suas ilhas por não existirem postos de trabalho para os cursos que realizaram. Por isso as ilhas pequenas estão a ficar sem jovens, que vão para as maiores, ficam no continente ou vão para a Europa.

AE – A não adoção de medidas de austeridade tão fortes na Região como noutros pontos do país pode ter ajudado a não serem tão visíveis as consequências da atual situação económico-financeira?
ASB – O desemprego terá aumentado nos últimos meses…
Há um esforço da parte do Governo e das empresas, que estão a ser apoiadas pelo Executivo, para não eliminarem postos de trabalho.
Há a consciência de que é necessário garantir à Região postos de trabalho. Costumo até dizer, quando falo às IPSS, Santas Casas e Centros Sociais Paroquiais, que as Obras de Misericórdia já não são 14, mas 15. E a 15ª é criar postos de trabalho.

AE – Ainda não se terá sentido muito a austeridade nos Açores?
ASB – A impressão que tenho – e viajo bastante de ilha para ilha – é que as medidas de austeridade que têm um impacto mais duro se sentem nos Açores como no continente. Não quero trair os meus conterrâneos dizendo que não há dificuldades. Elas existem. Nós somos uma região pobre e aguentamos mais algumas dificuldades! Mas tudo tem os seus limites. Precisamos que Portugal não nos deixe. Somos uma Região Autónoma mas fazemos parte de Portugal.

AE – O que é que espera das próximas eleições regionais?
ASB – Espero que o povo vá votar. Não gosto nada que a abstenção cresça.
A maioria do povo açoriano é católica e a fé cristã deve formar cidadãos intervenientes e ativos, sendo a primeira obrigação participar no ato eleitoral. Espero que participem e que diminua a abstenção, bastante elevada há quatro anos, e que as pessoas vençam a desconfiança na política e votem em quem acham que pode conduzir os Açores nestes próximos anos.

AE – Nestas eleições regionais poderá acontecer uma mudança de ciclo político nos Açores?
ASB – Não sei. O povo é quem mais ordena…

Valorizar a Religiosidade popular
AE – A religiosidade popular dos açorianos contribui para a dinamização pastoral na diocese?
ASB – Sim. É um ótimo ponto de partida para uma verdadeira evangelização.
Podemos dizer que, além da programação pastoral que a diocese promove, há já um programa feito ao ritmo da religiosidade popular, que temos de valorizar e evangelizar.
Estou convencido que a nova evangelização tem muitas oportunidades no reconhecimento dos valores reais da fé cristã que existem nas manifestações de religiosidade popular.

AE – Com a visita à diocese de D. Rino Passigato, núncio apostólico, aconteceu essa valorização da religiosidade popular?
ASB – Sim. O facto de o senhor núncio apostólico ter sido convidado a presidir às festas do Senhor Santo Cristo, em Ponta Delgada, exprime o apreço que a Igreja tem pela religiosidade popular e o esforço que tem de fazer por a orientar. D. Rino Passigato, nas oportunidades de pregação, procurou precisamente dar orientações nesse sentido.
Aproveitámos a ida do núncio apostólico a Ponta Delgada para realizar a visita oficial à diocese. Esteve nas Ilhas da Terceira, Pico e Faial, onde teve oportunidade de testemunhar o nosso compromisso de viver cada vez mais e melhor a nossa ligação ao Papa (o núncio veio enquanto representante do Papa).

AE – Que balanço faz da visita?
ASB – Positivo porque o senhor núncio pôde ver um pouco a nossa realidade: esteve em quatro ilhas, em oito dias, e experimentou a instabilidade no nosso clima. Por outro lado foi uma boa ocasião porque na semana anterior ao Senhor Santo Cristo decorreu o Conselho Presbiteral anual e, na semana seguinte, a reunião dos Ouvidores das diversas ilhas. Eram reuniões previstas que contaram com a presença do senhor núncio.

AE – O inquérito sobre Identidades Religiosas em Portugal não se realizou na Diocese de Angra, como na do Funchal. Acha que os resultados estarão em sintonia com os do Continente ou teríamos surpresas?
ASB – A realidade dos Açores deve ser semelhante à do Norte de Portugal. Não tem comparação com Lisboa e Vale do Tejo.
Até agora não se realizou…

AE – Já tem indicações de quando se realizará?
ASB – O mais breve possível, para que não haja muito desfasamento em relação ao continente.
Pelo que sei a amostra está bem constituída. O estudo vai ser feito em três ilhas; cada uma representa a diocese no que respeita à prática religiosa: São Miguel está acima da média, o Faial, e a que está abaixo da média, a Terceira.

AE – A valorização da religiosidade popular poderá evidenciar-se neste inquérito?
ASB – Creio que sim porque inclui perguntas muito interessantes sobre as representações religiosas e a sensibilidade pessoal.
Veremos, por isso, que mesmo que as pessoas não sejam praticantes regulares têm uma sensibilidade e uma representação

AGÊNCIA ECCLESIA